Unidades de menor porte sofrem com a crise; SUS ainda é responsável por maioria dos atendimentos
O Brasil tem cerca de 6.000 hospitais —deles, 4.400 são privados. Mas o SUS responde pela maior parte dos atendimentos hospitalares do país: 302.542 leitos contra 135.481 particulares.
São números que encolheram nesta década. Levantamento do CFM (Conselho Federal de Medicina) mostra redução de 23.600 leitos no SUS de 2010 a 2016 e, desde então, mais 10 mil foram desativados.
A rede privada também sofre: pesquisa da FBH (Federação Brasileira de Hospitais) mostra que há hoje 31.454 leitos a menos que em 2010. São 1.797 hospitais privados que fecharam as portas, 70% deles com até 50 leitos. Como foram abertas 1.367 instituições, são 430 hospitais a menos.
Os gargalos da rede pública são velhos conhecidos: falta de investimento e repasses defasados. O SUS paga cerca de 45% do custo dos procedimentos, segundo o CFM e a FBH.
Em nota, o Ministério da Saúde diz que faz adequações periódicas na Tabela SUS. No ano passado, foram reajustados 79 procedimentos. Desde 2010, foram mais de mil.
Segundo a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), o debate sobre modelos de remuneração vem ocorrendo nas principais ações da agência, por meio de grupos de trabalho e pesquisas.
A rede privada de pequeno porte sente o impacto da crise e o encolhimento dos planos de saúde. “Além da questão da escala, o relacionamento com as operadoras e o poder de barganha são menores”, diz Bruno Sobral de Carvalho, consultor responsável pelo estudo da FBH. As pequenas instituições reclamam do prazo para pagamento das operadoras, que chega a 120 dias, e dos contratos pouco flexíveis.
Esses hospitais servem de referência também para atendimentos de alta complexidade do SUS em cidades do interior e são a grande maioria no país. Mais da metade das instituições privadas tem até 50 leitos. Não há sinalização de recuperação no curto prazo, segundo Carvalho. “A perda na rede privada significa 1,7 milhão de internações a menos. Seriam necessários R$ 31 bilhões para reposição.”
Enquanto isso, os investimentos se concentram em hospitais de grandes cidades e de grande porte (mais de 150 leitos). A Anahp (Associação Nacional dos Hospitais Privados) constatou que 49 instituições tiveram aumento de 24% no número de leitos de 2010 a 2017. A associação tem entre seus membros os 103 maiores hospitais do Brasil.
“Essas instituições estão em cidades com economia forte e podem investir porque têm boa carteira de pacientes para explorar”, diz Tércio Kasten, presidente da CNS (Confederação Nacional da Saúde).
É o caso da Rede D’Or, que investirá R$ 1 bilhão até 2019 em três hospitais oncológicos de São Paulo, Rio e Brasília.
Em construção, a unidade brasiliense do Sírio-Libanês deve ficar pronta em novembro e oferecerá 144 leitos ao custo de R$ 260 milhões. No Rio, o CHN (Complexo Hospitalar de Niterói) fez um aporte de mais de R$ 100 milhões, dobrou de tamanho e abriu 194 leitos. O Hospital Alemão Oswaldo Cruz abriu em julho de 2017 a unidade Vergueiro, em São Paulo, com 260 leitos.
O Ministério da Saúde não estabelece número de leitos ideal para o país. Sem índice fixo, a Organização Mundial da Saúde aponta que a média mundial é de 3 leitos por mil habitantes. O Brasil tem 2 leitos para mil habitantes. “A média mundial inclui países bem mais pobres, então nossa taxa está ruim”, diz Carvalho.
“É um índice difícil de se adequar ao grau de complexidade de nosso país”, afirma Jecé Freitas Brandão, do Conselho Federal de Medicina.
Para Ana Maria Malik, coordenadora do FGVSaúde, a discussão não deve estar focada em número de leitos, e sim em gerir melhor os leitos disponíveis, que acabam usados por pacientes que não precisariam estar internados em um modelo único de hospital.
“O Brasil é hospitalocêntrico e sofre deficiência importante em termos de políticas públicas para tratar quem não precisa de hospital”, diz. “É mais razoável aumentar a eficiência das instituições segundo necessidades locais que pensar só em números”.