Capital e trabalho no século 21

A grave crise econômica que enfrentamos traz em seu bojo, paradoxalmente, a esperança de grandes mudanças estruturais que podem contribuir para recolocar o Brasil na rota do crescimento com justiça social.

Esse é o caso da modernização da legislação trabalhista, antiga bandeira dos empresários brasileiros, tantas vezes ensaiada e até hoje não efetivada em razão de resistências corporativas, que agora podem ser superadas pelos legisladores diante da profundidade dos desafios colocados perante o país.

Cientes de que não podem deixar passar essa oportunidade de modernizar nossas relações trabalhistas, as lideranças empresariais dos setores de comércio e serviços respaldam os pontos essenciais da reforma proposta pelo governo.

Destaca-se, em especial, o dispositivo que coloca os acordos livremente negociados entre empregados e empregadores acima de uma legislação engessada e anacrônica, que não dá conta da realidade econômica nacional e, muito menos, da mundial.

O Brasil encareceu em demasia o ato de empregar. Taxas, tributos, impostos e multas na eventual demissão somam-se à burocracia das informações, dos relatórios e das exigências legais que as empresas devem atender para formalizar um empregado. Além disso, há o custo do risco trabalhista, dado que o país é recordista absoluto de litígios na área, com mais de três milhões de processos em andamento.

Vantagens para as duas partes resultarão de um mercado de trabalho mais dinâmico, sem prejuízo dos direitos que poderão ser desfrutados por aqueles que hoje padecem as agruras da informalidade ou do desemprego. É o que ocorrerá com a regulamentação da terceirização aprovada pelo Congresso Nacional, que não pode ser confundida com precarização do trabalho.

Isso uma vez que, ao contrário, assegura os direitos dos mais de 10 milhões de trabalhadores terceirizados, que há muito tempo fazem parte da organização produtiva das empresas, sem que estas pudessem contar com a segurança jurídica que passarão a ter.

Nesse aspecto, vale lembrar que a nossa Constituição coloca no mesmo plano os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o que infelizmente não se reflete nas leis trabalhistas ou nas decisões da Justiça do Trabalho, para dissabor de quem investe e gera empregos.

Embora haja deficiências no atual modelo de representação sindical, deve se ter em mente que os sindicatos nada mais são do que trabalhadores e empregadores de determinada categoria, eleitos por seus pares para representá-los, com prerrogativas e deveres constitucionalmente estabelecidos.

O processo negocial é cíclico e benéfico, possibilita aos sindicatos o contato constante com suas bases, fortalece o movimento e sua representatividade na medida de seu desempenho.

Para o avanço e a obtenção de resultados nas negociações coletivas, é fundamental e natural que a lei passe a desempenhar de forma progressiva um papel secundário na satisfação de anseios e nas necessidades das partes envolvidas.

Compatibilizar as relações laborais com os processos e os níveis de informação e produtividade exigidos no século 21 significa entender que conflitos entre capital e o trabalho não encontram mais soluções satisfatórias mediante tutela estatal.

Os direitos e deveres que regulam as relações de trabalho podem e devem ser cada vez mais resultado do consentimento direto dos interlocutores sociais e, inversamente, cada vez menos produto de uma imposição legislativa estanque no tempo.

ABRAM SZAJMAN é presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), entidade que gere o Serviço Social do Comércio (Sesc) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) no Estado

Fonte: www.folha.com.br