Usando o peixe-zebra, Leonard Zon estudou por que muitas células com genes de câncer não se tornam cancerosas (Shiho Fukada para The New York Times)
POR GINA KOLATA
FEVEREIRO 20, 2016
Era apenas uma pinta, uma única célula que os pesquisadores tinham marcado com tinta verde. Mas era a primeira célula do que cresceria até se tornar um melanoma, a forma mais mortífera de câncer de pele. Nunca um câncer havia sido captado tão precocemente.
A célula então se reverteu a uma forma embrionária. Quando começou a se dividir, os genes do câncer assumiram o controle, e um enorme tumor surgiu.
Essas foram as conclusões de Leonard Zon, do Hospital Infantil de Boston, e de Charles K. Kaufman e colegas em um estudo, publicado na revista “Science”, que oferece hipóteses de como o câncer se desenvolve. Os pesquisadores abordaram um velho enigma: por que muitas células com genes de câncer nunca se tornam cancerosas?
O trabalho foi feito com peixes que receberam genes humanos, mas há indicações de que também em homens os melanomas se desenvolvem quando uma célula volta a um estado embrionário. Novos estudos são necessários, mas os pesquisadores acreditam que estão no caminho certo para compreender por que os melanomas e possivelmente outros cânceres se formam, e potencialmente evitá-los.
A ideia predominante sobre o desenvolvimento de um câncer é que os genes de uma célula saudável sofrem uma mutação aleatória, talvez pela exposição ao sol, talvez por má sorte. Os genes mutados então promovem um crescimento celular aberrante, e a massa crescente de células acumula cada vez mais mutações que a levam a crescer mais depressa e a se espalhar até que, finalmente, forma-se um câncer.
No entanto, há genes de câncer em células saudáveis que não se tornam malignas. “A maioria das verrugas não se transforma em câncer”, disse Keith T. Flaherty, especialista em melanoma. Apesar disso, quase toda verruga contém uma das duas poderosas mutações de genes típicas dos melanomas, BRAF ou NRAS, acrescentou ele, e uma terceira também abriga outro gene cancerígeno, o P53.
“Cada vez mais dados sugerem que só ter mutações não é suficiente para causar câncer”, disse Kornelia Polyak, pesquisadora no Instituto do Câncer Dana-Farber em Boston.
Foi aí que Zon e seus colegas começaram, há dez anos. Eles estavam investigando o melanoma criando-o em peixes-zebras, pequenas criaturas transparentes que permitem que os pesquisadores vejam suas células e órgãos. Os pesquisadores colocaram genes humanos BRAF e P53 em todas células pigmentadas do peixe. Se os genes fossem tudo o que era necessário para o câncer, o peixe explodiria com melanoma. Mas não foi isso que aconteceu. Apenas de uma a três células por peixe passaram a ter melanoma.
Os pesquisadores perceberam que as únicas células que haviam se tornado cancerosas tinham acionado um gene que normalmente só é ativado nas que fazem parte da crista neural —grupo de células ativadas no início da vida embrionária que podem se transformar em diversas células.
Quando essas células se desenvolvem em seu tipo de tecido maduro —célula de pele pigmentada, osso ou dente, por exemplo—, o gene da crista se fecha.
As células dos peixes que tinham melanoma tinham a crista neural ativa, ou seja, tinham revertido àquele estado primitivo.
Os investigadores então marcaram as células que tinham um gene da crista ativo com uma tinta fluorescente, permitindo que eles localizassem as células. E observaram o que aconteceu. Toda vez que uma célula se acendia em verde, ela se dividia e se transformava em um câncer.
Faz sentido que o câncer esteja relacionado a essas células primitivas, disse Polyak, porque elas são mais prolíficas e mais capazes de se disseminar pelo corpo.
No entanto, restam perguntas. Estas incluem por que os melanomas com mutações BRAF eventualmente se tornam resistentes a drogas que bloqueiam o gene do câncer BRAF.
Fonte:www.folha.com.br