Fiocruz solta no Rio mosquitos imunes à dengue para conter a doença

Após dois anos de estudos, a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) iniciou nesta quarta (24) os testes de campo de uma ambiciosa estratégia internacional de combate à dengue: a introdução na natureza de exemplares do mosquito transmissor, o Aedes aegypti, imunes à doença.

No total, 10 mil mosquitos “vacinados” foram liberados em Tubiacanga, na Ilha do Governador, zona norte do Rio. Esta é a primeira vez que um país nas Américas leva o estudo à prática; a iniciativa está em curso na Austrália, no Vietnã e na Indonésia.

Como a bactéria Wolbachia já é encontrada em cerca de 70% dos insetos na natureza, incluindo moscas-das-frutas e pernilongos “comuns”, os pesquisadores afirmam que sua introdução nos mosquitos da dengue não traz riscos.

Em laboratório, cientistas contaminam os embriões do Aedes aegypti com uma variante da bactéria Wolbachia que impede o desenvolvimento do vírus da dengue no organismo do mosquito.

Com autorização do Ibama, a Fiocruz importou os primeiros ovos de Aedescom Wolbachia da Austrália. Em quatro anos, R$ 3 milhões foram investidos no projeto.

Mauro Pimentel/Folhapress
Recipiente contendo alguns dos mosquitos antidengue da Fiocruz liberados na Ilha do Governador
Recipiente contendo alguns dos mosquitos antidengue da Fiocruz liberados na Ilha do Governador

Pesquisador da Fiocruz e líder do projeto no Brasil, Luciano Moreira diz que os resultados já devem ser notados no próximo ano.

Segundo ele, a imunização também tem 60% de eficácia contra a febre amarela e o vírus chikungunya (“primo” da dengue), mas essa proteção ainda está em estudo.

Moreira diz que os mosquitos com a bactéria serão liberados semanalmente na Ilha do Governador por até quatro meses, de acordo com a avaliação da capacidade dos mosquitos de se instalarem.

Para reduzir o incômodo para a população, foi feita uma “supressão dos criadouros” antes do início da liberação dos mosquitos com bactéria. O objetivo foi reduzir a quantidade de Aedes aegypti, para que, ao liberar no bairro os mosquitos com a bactéria, o número total deles não sofresse alteração.

Há dois anos, o morador Amilton Clemente de Souza, 64, guarda em sua casa uma armadilha instalada por pesquisadores para capturar mosquitos e ajudar no teste.

“Acredito que seja um benefício para a população, apesar dos resultados ainda serem incertos”, disse Souza.

Outros moradores criticam o projeto. “Estão fazendo a gente de cobaia já que aqui não é uma área beneficiada, que pode ser esquecida se não der certo”, disse Ernestina Alves, 49, que questiona por que a pesquisa não é feita numa área nobre do Rio.

A Fiocruz afirma que Tubiacanga foi escolhida entre outras 27 áreas da cidade examinadas. “A gente queria uma área que tivesse mosquito o ano todo e casos de dengue”, diz Moreira.

CONCORRÊNCIA

O mosquito com bactéria não é o único inseto modificado em laboratório para tentar conter a dengue.

Mosquitos produzidos pela empresa britânica Oxitec são geneticamente modificados para terem descendentes estéreis. O objetivo é reduzir em cerca de 80% a 90% a população dos insetos.
Moreira, da Fiocruz, afirmou que preferiu optar por uma “estratégia natural e autossustentável”.

“Após o estabelecimento de Aedes com Wolbachia no ambiente, a bactéria é transmitida para as gerações seguintes de mosquitos. Eles predominam sem que precisemos soltar constantemente mais mosquitos com a bactéria”, disse o pesquisador.

 

Fonte: www.folha.com.br

24/09/2014